sexta-feira, 9 de outubro de 2015

A Arte: um culto ao não descartável

Hoje, a sociedade é uma sociedade de transações, das quais a que mais se destaca é as transações baseadas no consumo, que, por sua vez, obedecem a uma lógica específica atrelada a realidade do capitalismo pós-moderno que tem na identidade comercializável um dos seus fundamentos. Assim, na atualidade, muito mais do que uma mercadoria fruto do trabalho, se vende subjetividades que devem constantemente sofrer atualizações de acordo com os ditames do mercado. 




Nas palavras do sociólogo Bauman, 
Na sociedade de consumidores, ninguém pode se tornar sujeito sem se tornar antes mercadoria, e ninguém pode manter segura a sua subjetividade sem reanimar, ressuscitar, e recarregar de maneira perpétua as capacidades esperadas e exigidas de uma mercadoria vendável. A subjetividade do sujeito [...] concentra-se em um esforço sem fim para ela própria se tornar, e permanecer uma mercadoria vendável. A característica mais proeminente da sociedade de consumidores [...] é a transformação dos consumidores em mercadorias, ou antes sua dissolução no mar de mercadorias.

Neste panorama, vivemos as coisas como se essas fossem imateriais, dotamos-nas  de um tom monótono e cinzento, as deixamos flutuar  com igual gravidade na constante corrente do dinheiro e nos posicionamos no engajamento incessante da atividade de consumo, no movimento ilusório de saída da invisibilidade que permeia o que é consumido. Em síntese, vivemos uma vida do descartável. 

A arte, no entanto, quando de fato arte, se propõe a estar além da vida descartável, pois apesar de se apresentar como atividade dinâmica está ligada a permanência do humano e a crítica da reificação ( do entendimento do humano como coisa, produto) ela deve se configurar, como apontado pelo sociólogo Adorno, em algo que produz sentido histórico, que cria uma relação diferente com a sociedade. 

A relação da arte com a sociedade deve negar o princípio do descartável e da pasteurização, que o pseudo-diferente coloca nos anúncios do "novo". A arte tem em sua feitura um compromisso para além do capital que manipula os aspectos da vida, ou seja, em sua forma ela estrutura uma nova proposta que denuncia o estado presente e aponta, através do protesto, para uma realidade de desalienação em um enaltecimento estético da possibilidade de um futuro para além da violência da desumanidade. 

A arte é  desconfortável para aquele que se senta afim de degustar mais um produto de consumo que é vendido como arte e que se perderá após algum tempo, sendo substituído por outro artefato do consumo tão pobre quanto. A arte, portanto, é um culto ao não descartável, ela é o enaltecimento, em sua própria autonomia, da liberdade criativa não enformada pela lógica instrumental que descamba a própria vida em objeto de consumo.

E assim como a arte deveria ser ( Adorno, apesar de apontar isso, é pessimista em sua realização e coloca tal manifestação plena como possível após uma revolução social) também deveria ser o culto cristão. Culto e Arte estão de mãos dadas naquilo que a Bíblia coloca como a renovação do entendimento. No culto, assim como na arte, não deve haver espaço para o descartável, apenas para o dinâmico, não para o entretenimento, mas para o deleite sério de se estar diante de algo que em sua manifestação aponta, através da denúncia de uma certa condição, para algo além daquilo que se vive na desumana existência do homem.   

BIBLIOGRAFIA 

BAUMAN, Zigman. Vida para o Consumo. Rio de Janeiro: Zahar, 2008 

HORKHEIMER, Max & ADORNO, Theodor. A indústria cultural: o iluminismo como mistificação de massas. Pp. 169 a 214. In: LIMA, Luiz Costa. Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2002. 364p.

AGUIAR, Wisley Francisco. Adorno e a Dimensão Social da Arte. Disponível in: http://www.urutagua.uem.br/015/15aguiar.htm 

DANNER, Fernando. A Dimensão Estética em Adorno. Disponível in: http://sites.unifra.br/Portals/1/ARTIGOS/edicao3/A_dimens%C3%86o_est%E2%80%9Atica_em_Theodor_W._Adorno_revisado.pdf
 

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