Isaías
55.2- Por que gastar dinheiro naquilo que não é pão e o seu
trabalho árduo naquilo que não satisfaz? Escutem, escutem-me e
comam o que é bom, e a alma de vocês se deliciará na mais fina
refeição.
Provérbios
30. 15a- A sanguessuga tem duas filhas: Dá e Dá.
Eclesiastes
2. 10-11: Não me neguei nada que os meus olhos desejaram não me
recusei a dar prazer algum ao meu coração. Na verdade, eu me
alegrei em todo o meu coração, essa foi a recompensa do meu
esforço. Contudo, quando avaliei tudo o que tanto me esforçara para
realizar, percebi que tudo foi inútil, foi correr atrás do vento;
não há qualquer proveito no que se faz debaixo do sol.
Eclesiastes
2. 26: Ao
homem que o agrada, Deus recompensa com sabedoria, o conhecimento e
felicidade Quanto
ao pecador, Deus o encarrega de ajuntar e armazenar riquezas para
entregá-las a quem o agrada. Isso também é inútil, é correr
atrás do vento.
Não
dá para falar em existência sem usufruto. A própria essência do
ser, nos leva a tal condição. O ser humano é um ser de
necessidades e desejos, ambas as caraterísticas nos levam ao estado
do usufruto, que é motor para a sensação de completude e gozo,
seja físico, social ou psicológico. E não há nada de errado
nisso.
Mas,
com o advento das revoluções industriais e burguesa e o
estabelecimento do capitalismo como sistema econômico predominante,
o consumismo surge no lugar do usufruto e por intermédio do
capitalismo, como fala um filósofo chamado Giorgio Agamben, a esfera
do consumo surge e tudo que é produzido, feito e vivido é colocado
dentro dessa esfera e o uso destas coisas se torna duravelmente
impossível, pois,
“O consumo, mesmo no ato do seu exercício, sempre é já passado ou futuro e, como tal, não se pode dizer que exista naturalmente, mas apenas na memória ou na expectativa. Portanto, ele não pode ter sido a não ser no instante do seu desaparecimento." ( AGAMBEN, 2007, p 64).
O
efêmero e o transitório se tornam o princípio que regem a
existência, tal processo insere nossas vidas no que o sociólogo
Bauman (2008) chama de sociedade de consumidores, onde nossas relações
humanas seguem os mesmos padrões existentes entre consumidores e
objetos de consumo, ou seja, primeiramente somos postos à vista ( à
venda) e nosso fim é sermos consumidos, mas para que isso ocorra é
necessário que possamos satisfazer o desejo de quem nos consome e o
nosso preço final será devidamente proporcional a credibilidade de
nossa capacidade de satisfação e a intensidade do desejo daquele
que nos consome. Portanto, nos nossos dias, somos ao mesmo tempo
promotores de mercadorias e as mercadorias que promovemos.
Na
sociedade de consumidores, ainda nos diz Bauman, ninguém pode se
tornar sujeito sem primeiro virar mercadoria e ninguém pode se
manter seguro, sem ressuscitar e carregar de maneira perpétua as
capacidades esperadas e exigidas de uma mercadoria vendável. O
próprio eu do sujeito e tudo que ele pode atingir, concentra-se num
esforço sem fim para se tornar e permanecer uma mercadoria vendável.
A característica mais proeminente da sociedade de consumidores –
ainda que cuidadosamente disfarçada e encoberta- é a transformação
dos consumidores em mercadorias, ou antes, sua dissolução no mar de
mercadorias.
O
objetivo dos consumidores e sua motivação estimuladora para se
engajar na incessante atividade de consumo é sair da invisibilidade
do mar de mercadorias, destacando-se da massa de objetos
indistinguíveis. O que se quer com o consumismo, portanto, não é
nada mais, nada menos, do que ser desejado e isto significa ser uma
mercadoria atraente.
Aqui chegamos ao ponto crucial, capaz de fazer o trânsito entre
sociologia e cristianismo: consumismo está ligado a vaidade e é
talvez a face capitalista desse pecado, temperado com um quê de
luxuria expresso no desejo erótico de ser desejado e ser objeto de
consumo de outros, quiça de todos. Mas a profundidade da devassidão
encontrada no consumismo não para por ai, pois no desejo pervertido
está também a impossibilidade da duração, a exigência da
perfeição e por fim o descompromisso com o próprio ser.
Em
uma sociedade de consumistas não se espera que consumidores jurem
lealdade aos objetos que são destinados ao seu consumo, o que nos
remonta a ideia já exposta do filósofo Agamben e nos permite dizer
que não somos viciados no ter, mas na capacidade do ter, na ação
do ter, na fugaz sensação de poder ter. Algo que logo se acaba
quando temos e percebemos que o que temos não é perfeito, o que faz
com que nos movamos para a próxima compra em um ritmo frenético e
incessante.
Mas
como já dito, em um mundo de consumo, não apenas bens e serviços
são produtos, mas também seres humanos e a estes as mesmas lógicas
são aplicáveis, o que significa dizer que a deslealdade destinada
aos objetos de consumo quando aplicadas ao contexto das relações
humanas transformam o atar e desatar de vínculos em ações
destituídas de moral significativa, o que garante isenção de
responsabilidade das pessoas envolvidas na criação de
relacionamentos bons e duradouros, os quais para existir sempre
necessitam em suas receitas de empatia e auto sacrifício.
Portanto
a questão é bastante simples, o consumismo, que é vaidade, também
envolve em seu bojo a sede doentia por prazer desenfreado, ou seja, o
hedonismo. A todo momento buscamos a felicidade e o gozo na falta,
na nossa vaidade o que leva necessariamente ao afastamento de Deus e
a produção de ídolos efêmeros e a idolatria do próprio ego, como
também violência para com o próximo.
Na Bíblia encontramos bem clara a ideia motora do consumismo, que é
o pecado, mas também encontramos a solução, que é um
relacionamento sincero com Deus. Sabemos a partir do que é dito em
Provérbios 30. 15 que não há limites para a ambição humana, que
esta é insaciável, temos a certeza que mesmo que venhamos a
conceder tudo aquilo que nosso egoísmo e ambição vier a desejar
isso nada passará do que inutilidade, uma corrida atrás do vento,
da qual não se tira proveito nenhum, como bem nos fala o discurso do
sábio em Eclesiastes 2. 10-11, o que nos leva a concordar com Isaías
no capítulo 55 e verso 2 de seu livro e fazer de sua pergunta uma
afirmação: gastamos dinheiro naquilo que não é pão e gastamos
nosso trabalho nas mais diversas coisas que verdadeiramente não nos
trazem satisfação.
Qual
seria a saída diante de um contexto aparentemente tão trágico? A
própria Escritura nos dá a saída em diversas passagens, mas dentre
muitas, gostaria de selecionar duas, iniciando a argumentação a
partir do capítulo 55 de Isaías e do verso 1. Neste capítulo,
encontramos um apelo e uma certeza de salvação, a figura do
banquete é usada como metáfora para esta oportunidade, o verso 2,
em sua primeira parte chama a atenção do povo para que este tome
consciência de que vive sem prestar atenção no verdadeiro pão, ou
seja, se importando com o que é efêmero; a segunda parte do verso
revela que a mensagem de salvação é o pão, o que dá vida, o que
é bom e importante, neste sentido, a aplicação não poderia ser
outra, o remédio para a vaidade e o vazio de uma vida que gasta com
o banal é a salvação oferecida por Deus, única condição que
concede alegria plena, paz profunda e gozo eterno.
Se
arrepender e abraçar a salvação de Deus nos eleva a outro nível
de relacionamento que nos tira da lógica da sociedade de consumo e
nos faz perceber que pessoas não são mercadorias, mas sujeitos que
devemos amar e respeitar, nossos vínculos acabam por receber um novo
sentido e começam a ser tecidos a partir dos padrões do vínculo
salvífico que Deus teceu conosco, a durabilidade torna-se
prioridade, o que insere novamente na equação o autosacrifício e
a empatia. Para combater a lógica do consumismo e as suas raízes
maléficas somos convidados a por em prática o princípio da graça,
devemos amar a Deus acima de todas as coisas e amar o nosso próximo
como nos amamos e isso é agradável aos olhos do Senhor.
Por
fim, quando nossa consciência convertida inclina nosso ímpeto a
vontade de Deus, Este nos garante a certeza e a concretização
daquilo que os indivíduos imersos em um contexto de consumismo e
vaidade tanto buscam de maneira errônea, Deus nos garante prazer,
conhecimento, sabedoria e felicidade, pois a capacidade de apreciar
tais coisas e de gozar a vida não está em nossas mãos, mas provém
unicamente da graça de Deus.
Referências
AGAMBEN, Giorgio. Profanações. Rio de Janeiro: Boitempo, 2007
BAUMAN, Zigman. Vida para o Consumo. Rio de Janeiro: Zahar, 2008
Referências
AGAMBEN, Giorgio. Profanações. Rio de Janeiro: Boitempo, 2007
BAUMAN, Zigman. Vida para o Consumo. Rio de Janeiro: Zahar, 2008
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