quinta-feira, 27 de agosto de 2015

A Arte e a Imagem e Semelhança de Deus




Todo cristão professa que Deus é criador de todas as coisas e  implicitamente admitem que Deus possui senso estético guiador de sua força criativa permitindo que tudo que foi feito seja bom. Assim, concluem muitas vezes sem consciência do impacto dessa afirmação que Deus, em essência, é um ser eternamente criativo. Da mesma forma, cristãos no mundo inteiro professam como crença basilar a doutrina da imagem e semelhança de Deus, bem como da depravação dessa imagem e o ato de amor de Deus pelo qual ele exerceu sobre si a responsabilidade de regenerar todo o nosso ser trazendo-nos da trevas para o Reino, como diz Paulo, "Ele nos resgatou do domínio das trevas e nos transportou para o reino do seu Filho amado, em quem temos a plena redenção por meio do seu sangue, isto é, o perdão de todos os pecados." (Colossenses 3. 14-15). Assim, afirmando que pervertemos com o pecado aquilo que nos faz imagem e semelhança sujando tudo que vem disso, mas que com a redenção tudo aquilo que fazemos agora é feito para a glória de Deus, mediante a graça de Cristo, pois pelo seu sangue fomos perdoados.

Charles Hodge (2001), teólogo presbiteriano clássico, explica que a imagem e semelhança de Deus inclui pontos como natureza intelectual e moral, nas suas palavras: 
Deus é espírito, alma humana é espírito. Os atributos essenciais do espírito são a razão, a consciência e a vontade
A imagem e semelhança de Deus abarcaria além desses atributos básicos, o conhecimento, a justiça e a santidade. A retidão original apresentaria uma harmonia que começaria com a sujeição da razão à vontade de Deus e terminaria com o exercimento de justiça e da prática do conhecimento como exercício estético ( apreciação do belo), exercício moral ( santidade exercida no campo do "certo e errado") e exercício espiritual ( comunhão e conhecimento de Deus). 

Dito isso, podemos perceber como na contemporaneidade o entendimento da imagem e semelhança redimida por Deus é fragmentária e precária, o que muitas vezes acaba por podar as esferas de atuação da nossa nova natureza em Cristo, reduzindo-a as manifestações litúrgicas e as ações intra-comunidade. Infelizmente, transvestimos o conceito de imagem e semelhança de Deus em uma muda de roupa que se veste para ir a igreja, quando a verdade é que o conceito é amplo e vai para além do que é feito na congregação, envolvendo todo nosso ser em todas áreas, inclusive a arte. 

A arte tem sofrido profundamente com o empobrecimento do entendimento sobre o conceito de imagem e semelhança de Deus, principalmente quando a entendemos como "toda extensão da expressão humana" (SCHAEFFER, 2008) Não há como entendê-la em toda sua propriedade se não entendemos que ela é decorrente dos atributos essenciais do espírito, ou seja, da razão, da consciência e da vontade, bem como do exercício estético, que também provém de Deus. 

Limitar a arte ao contexto religioso litúrgico é transformá-la em propaganda e destituí-la do seu caráter revolucionário. A arte feita por cristãos precisa ser entendida como arte, ecoadora por si só da imagem e semelhança de Deus redimida e portanto sem necessidade de justificativa, e não como instrumento para algo. Mesmo a arte feita por não cristãos deve ser entendida dessa maneira, como uma forma de expressar a imagem e semelhança de Deus, mesmo que não redimida. 

Definitivamente arte não é meio, mas fim. Ela é um dos sinais dados por Deus de que somos mais do que a matéria diz que somos e isso precisa ser valorizado, principalmente por aqueles que são parte do corpo de Cristo. Criatividade é parte essencial da vida cristã, como filhos de um Deus criativo não devemos fazer deste atributo um detalhe. Assim, no cultivo da verdadeira espiritualidade, aquela que muda o mundo não por obrigação, mas porque esta é a consequência do amor divinal que nos habita, a arte é  um importante palco de atuação, pois também é indicador da imagem e semelhança de Deus.


REFERÊNCIAS

HODGE, Charles. Teologia Sistemática. São Paulo: Hagnos, 2001
SCHAEFFER, Frank. Viciados em Mediocridade.  São Paulo: W4 Editora, 2008 

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